A atualidade da obra e do pensamento de Allan Kardec
Explicação de *Cosme Massi na live “A atualidade da obra de Kardec”, de 01/11/2020, realizada pelo Christian Spiritist Community of Atlanta com o IDEAK.
Transcrição de Rui Gomes Carneiro.
É importante entendermos que a obra de Kardec continua atualíssima, que não precisa de nenhuma forma de reparo ou de alteração.
Vamos ver inicialmente, em “O Que É O Espiritismo”, um ponto fundamental para entendermos essa atualidade da obra e do pensamento de Kardec e dos Espíritos, elaboradores do Espiritismo.
Kardec vai definir nessa obra exatamente o que é o Espiritismo. Diz ele que “o Espiritismo é ao mesmo tempo uma ciência de observação e uma doutrina filosófica”. Ao afirmar que é uma ciência de observação, Kardec está colocando para nós aquilo que é essencial no processo de construção do Espiritismo, de ser uma ciência que se apoia na experiência; os princípios e as leis fundamentais do Espiritismo não foram obtidos ou formulados pela cabeça de uma pessoa simplesmente imaginando ou refletindo. Os princípios fundamentais, as leis do Espiritismo, se apoiam na experiência por meio da mediunidade nos chamados fenômenos espíritas, que permitiram que a formulação das leis e dos princípios do Espiritismo não fosse fruto apenas da razão.
O que caracteriza qualquer ciência prática, ou de observação, é que ela é construída por dois mecanismos fundamentais: a razão, essa faculdade humana que permite refletir, argumentar, comparar, analisar, e, por outro lado, a observação.
Assim, foi na análise racional dos fatos mediúnicos que se apresentaram ao longo do século XIX, em todas as partes do planeta, que o Espiritismo se fundamentou. Os fenômenos espíritas se apresentavam espontaneamente, e acabaram chamando a atenção de Kardec, que passou a observá-los com atenção. Com o auxílio de médiuns das mais diferentes localidades, Allan Kardec e os Espíritos organizaram e apresentaram a doutrina espírita, o Espiritismo, com as leis e os princípios fundamentais dessa ciência.
Então a doutrina espírita é uma ciência de observação, que se apoia em leis naturais, da mesma forma que diversas outras ciências, como a física, química, biologia, etc.
Entretanto, a observação que o Espiritismo faz obedece a princípios metodológicos diferentes dos das ciências citadas anteriormente, porque os fenômenos espíritas não podem ser repetidos à vontade pelo observador; eles dependem da iniciativa dos Espíritos. Então o método não é exatamente o mesmo que se usa na física, nas ciências da natureza que não dependam de uma inteligência — no caso do Espiritismo, dos Espíritos. Mas isso é um detalhe que aqui não é o nosso tema.
Ao mesmo tempo em que é uma ciência, o Espiritismo é uma doutrina filosófica: por quê?
Kardec explica isso dizendo: como ciência prática ele consiste nas relações que se estabelecem entre os homens e os Espíritos; e como filosofia compreende todas as consequências morais que podem ser obtidas dessas relações que a ciência estabeleceu. Então, como filosofia é uma análise dos princípios que foram obtidos de forma científica (observação e análise de fenômenos mediúnicos) por meio do estudo das leis naturais que regulam a vida dos Espíritos, obtidas experimentalmente.
Então não é um sistema filosófico inventado por Allan Kardec, mas uma análise filosófica apoiada na própria ciência espírita. Assim, quando Kardec vai fazer, por exemplo, a análise da moral, da ética, que é parte da filosofia espírita, essa moral não foi uma especulação que surgiu da imaginação de Kardec ou de qualquer outra pessoa. Essa moral, essa ética, surgem observando, em fenômenos mediúnicos, os estados de felicidade ou infelicidade dos Espíritos após a morte do corpo.
Então, é uma ética que se apoia nos efeitos da vida moral do encarnado sobre os próprios Espíritos, ao desencarnarem. É uma análise filosófica apoiada nos próprios princípios da ciência espírita. Não é uma filosofia especulativa, não é um sistema filosófico, mas constitui a construção das consequências filosóficas que se podem obter das observações das relações dos espíritos com os homens, a partir da ciência espírita.
Por isso Kardec, no preâmbulo dessa obra admirável “O que é o Espiritismo”, define o Espiritismo numa frase muito importante: “O Espiritismo é a ciência que trata da natureza, origem e destino dos Espíritos, bem como de suas relações com o mundo corporal”. Veja que aqui há o elemento chave da doutrina que Kardec nos apresenta: a ciência cujo objeto de estudo é a natureza, origem e destino dos Espíritos, e isso é muito importante.
O objeto de estudo do Espiritismo são os Espíritos: saber a natureza (o que são os Espíritos), saber a origem (como eles surgiram), saber o seu destino (o que ocorre com os Espíritos ao longo do tempo), saber as relações desses Espíritos com o mundo corporal. O elemento central é o Espírito. Isso é importante para não confundir o Espiritismo com nenhuma ciência acadêmica, dessas que se estuda numa universidade. O Espiritismo não pode ser confundido com nenhuma ciência natural, porque as ciências naturais estudam a natureza material e não a alma ou o Espírito. Então o Espiritismo não tem nenhuma relação com a física, química, biologia, ou disciplinas desse tipo, porque essas estudam a matéria, não estudam o Espírito. Então o Espiritismo é uma ciência independente dessas outras ciências.
Por isso Allan Kardec, já na introdução de “O livro dos Espíritos”, colocou uma frase que pode incomodar algumas pessoas: “O Espiritismo não é da alçada da ciência”. Ele está mostrando essa diferença: a ciência estuda a matéria, o Espiritismo estuda a alma, o Espírito, sua origem, natureza, seu destino e a forma como essa alma interage com o mundo corporal. Esse é um elemento chave para se entender a atualidade do Espiritismo segundo as obras de Allan Kardec. Por que é o elemento chave? Por que quando se percorre a produção de Kardec, constata-se que ele nos legou 23 livros. Se excluirmos o Catálogo Racional, que é mais um catálogo de livros que um indivíduo deve ter em sua biblioteca, sobram 22 livros com conteúdo Espírita, que são as 22 obras do chamado período Allan Kardec, que vai da publicação de “O Livro dos Espíritos” no dia 18 de abril de 1857, na primeira edição, até a publicação do último número da “Revista espírita”, que Kardec deixou pronta em abril de 1869.
Dos 22 livros, doze são as chamadas “Revistas espíritas”, que são parte essencial da produção de Allan Kardec. Nesses 22 livros não há só Espiritismo; Kardec faz aplicações do Espiritismo na análise, por exemplo, do livro Gênesis, de Moisés, tanto na “Revista espírita” quanto no livro “A Gênese”, ao falar da origem do mundo, do planeta, dos seres. Kardec, ao fazer uma aplicação do Espiritismo na leitura do livro Gênesis de Moisés, por exemplo, não pode usar só o Espiritismo, porque o Espiritismo trata da alma, do Espírito, e ele precisou fazer uso das ciências de sua época para interpretar, por exemplo, o significado dos seis dias da criação que está no Livro de Moisés. Kardec usa, nessa aplicação, tanto os princípios do Espiritismo quanto os conhecimentos das ciências da época, sejam da astronomia, da geologia, sejam de outras ciências.
Aí a pessoa vai ler alguns trechos da Revista e vai dizer “Poxa, Kardec usou uma ciência que sofreu mudanças, modificações; está ultrapassado.” Usou: e daí? As ciências que ele usou são ciências humanas, dos homens, que evoluíram, que sofreram modificações. O objeto do Espiritismo não é o elemento material, é a alma, o Espírito, então a obra de Kardec não está ultrapassada. Kardec usou a ciência dos homens fazendo um exercício de como se podia conjugar o Espiritismo com uma ciência para ler, por exemplo, o livro Gênesis de Moisés. Outro exemplo são os relatos que às vezes um Espírito ou outro fazem de planetas, de astronomia; estes não são temas propriamente espíritas, são opiniões de Espíritos, de pessoas, que querem, além de falar de Espiritismo, falar de progresso, de desenvolvimento.
No que diz respeito ao Espiritismo, os princípios e as leis fundamentais que regulam a vida do Espírito não mudou, e nunca mudará, pois tudo continua dentro das leis de Deus, eternas e imutáveis.
Então, nenhuma mudança é necessária na obra de Kardec. E não tem sentido querer modificar informações científicas na obra de Kardec, porque essas ciências já mudaram por si mesmas, e essas mudanças estão nos livros científicos adequados para isso. Não compete a ninguém querer mudar um livro que foi escrito no século XIX, que fez uso da ciência do século XIX.
Falar que Kardec deve ser atualizado porque nas suas obras tem informações sobre as ciências de sua época, que sofreram mudanças, evoluíram, não faz sentido. No que diz respeito aos Espíritos e às suas relações com os homens, a obra de Kardec continua atual, e, no meu entender, continuará atual para sempre, porque, para mim, os princípios propostos por Allan Kardec e pelos Espíritos, no que diz respeito aos Espíritos e às leis, são verdades, e como verdades são atemporais, não vão mudar com o tempo. Toda verdade bem sustentada, como são os princípios que Kardec e os Espíritos apresentam nas obras sobre Espiritismo, vão permanecer sempre do jeito que são.
Se não há necessidade de se fazer qualquer atualização nas obras de Allan Kardec no que diz respeito ao Espiritismo, também não se deve pensar em fazer nenhuma alteração porque alguma ciência que ele citou ou usou, ou algum Espírito citou ou usou, tenha modificado. O texto deve ser mantido do jeito que foi publicado, e cabe ao leitor, ao ver que há referência a ciência de época, olhar a ciência atual e ver se o raciocínio do livro ainda permanece válido. Mas isso é do leitor, cabe ao leitor fazer isso. Aquilo que Kardec trouxe em relação aos Espíritos, com muito argumento, com muito apoio de Espíritos superiores, é uma verdade, e como tal não tem necessidade de atualização.
Em seu último livreto, o Catálogo Racional, publicado em março de 1869, Kardec deixa claro que as suas obras constituem as obras fundamentais do Espiritismo, todas as 22 obras a que fiz referência. Então essas obras são o ponto de partida para o Espiritismo, e toda análise que se fizer de outros autores posteriores tem que estar ligada a essas obras fundamentais. Por isso Kardec, em “O Evangelho segundo o Espiritismo” e, também, na “Revista espírita”, propõe o controle universal da doutrina dos Espíritos, e nesse controle universal estabelece dois critérios essenciais:
O primeiro, que é o mais importante, é o critério que cabe aos homens aplicar para o controle universal: é a análise racional de tudo que foi ou vier a ser produzido sobre o Espiritismo, venha de homens ou de Espíritos. Essa análise racional consiste em verificar se há choque de qualquer informação nova com os princípios fundamentais do Espiritismo. Tudo que chocar a lógica, o bom senso, ou esses princípios fundamentais, estabelecidos nas obras de Kardec, deve ser deixado de lado, porque os princípios do Espiritismo estão muito bem fundamentados em fatos e no raciocínio. Então, o controle universal exige o conhecimento desses fundamentos, saber com clareza como esses princípios fundamentais foram elaborados, sua consistência, sua verdade, para, a partir daí, estudarem-se outros autores. O estudioso poderá, então, fazer as comparações com aquilo que se encontra nos 22 livros que constituem o fundamento do Espiritismo. É preciso separar aquilo que é o conhecimento das ciências materiais daquilo que é propriamente o Espiritismo.
— Veja também a live “A importância do estudo do Livro dos Espíritos” no canal Cosme Massi no YouTube.
*Observação. O texto acima foi retirado de uma exposição de viva voz. Como todo ensino oral, esta colocação pode não ser tão rigorosa com os sentidos das palavras, por efeito da proximidade entre as pessoas que conversam. É preciso, por isso, considerar que as definições dadas podem ser provisórias, e que alguns termos são usados em sentido figurado. Em todo caso, o fundo da mensagem não deixa equívocos.
Cosme Massi é Físico, Doutor e Mestre em Lógica e Filosofia da Ciência pela UNICAMP. Foi professor, pró-reitor e diretor de diversas universidades no Brasil. Ganhador do Prêmio Moinho Santista em Lógica Matemática. Escritor, palestrante e estudioso das obras e do pensamento de Allan Kardec há mais de 30 anos. Idealizador do IDEAK (Instituto de Divulgação Espírita Allan Kardec) e da KARDECPEDIA, plataforma grátis para estudos das obras de Allan Kardec. Reúne mais de duzentas aulas de Espiritismo na plataforma KARDECPlay.
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